sexta-feira, 15 de janeiro de 2010
BATAILLE MALDITO: o ateu místico
A confissão de Simone
e a missa de Sir Edmond
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(trechos)
Não é difícil imaginar o meu espanto. Simone atrás da cortina, ajoelhou-se. Enquanto ela cochichava, eu aguardava com impaciência os efeitos dessa travessura. O ser sórdido, cismava eu, pularia para fora de sua caixa, precipitando-se sobre a sacrílega. Nada de semelhante aconteceu. Simone falava baixinho, sem parar, diante da janelinha gradeada.
Avancei nas pontas dos pés.
Simone realmente se masturbava, colada entre as grades, o corpo tenso, as coxas afastadas, os dedos remexendo os pentelhos. Consegui tocá-la, minha mão alcançou o buraco entre as nádegas. Nesse momento, ouvi-a claramente pronunciar:
- Padre, ainda não disse o pior.
Seguiu-se um silêncio.
- O pior, padre, é que estou me masturbando enquanto falo com o senhor.
Mais alguns segundos, agora de cochichos. Finalmente, quase em voz alta:
Se não acredita, posso lhe mostrar.
E Simone se levantou, abrindo-se diante do olho da guarita, masturbando-se em êxtase, com a mão segura e rápida.
- E então, padreco – berrou Simone golpeando violentamente o armário - , o que você está fazendo no seu barraco? Batendo punheta também?
Mas o confessionário permanecia mudo.
- Então, eu vou abrir!
Lá dentro, o visionário sentado, de cabeça baixa, enxugava a testa encharcada de suor. A moça apalpou a batina: ele não reagiu. Ela arregaçou a imunda saia preta e tirou para fora um pau comprido, rosado e duro: ele se limitou a inclinar a cabeça para trás, com um trejeito e um zunido entre os dentes. Deixou Simone agir, e esta meteu a verga bestial na boca.
Sir Edmond e eu tínhamos ficado imóveis de espanto. O assombro me paralisava. Eu não sabia o que fazer, quando o enigmático inglês se aproximou. Afastou Simone com delicadeza. Depois, segurou o verme pelo pulso, arrancou-o para fora do buraco e o estendeu nas lajes, a nossos pés: o desprezível sujeito jazia feito morto pelo chão e a baba lhe escorria pela boca. O inglês e eu o transportamos, nos braços, para a sacristia.
De braguilha aberta, pau murcho, o rosto lívido, ele não ofereceu resistência, respirando com dificuldade; nós o jogamos numa poltrona de forma arquitetural.
- Señores – proferiu o miserável - , vocês acham que sou um hipócrita!
- Não – disse Sir Edmond, num tom categórico.
Simone perguntou-lhe:
- Como é o seu nome?
- Don Aminado – respondeu.
Simone esbofeteou a carcaça sacerdotal. Com o golpe, a carcaça enrijeceu novamente. Ele foi despido; Simone, de cócoras sobre as roupas jogadas no chão, mijou feito uma cadela. Em seguida, Simone masturbou o padre e o chupou. Eu enrabei Simone.
Passados alguns minutos, o inglês voltou à sala, trazendo consigo um cibório decorado com anjinhos nus como cupidos.
Don Aminado contemplava fixamente aquele recipiente de Deus colocado no chão; o seu belo rosto idiota, contorcido pelas mordidas com que Simone lhe excitava o pau, expressava um desvario absoluto.
O inglês tinha trancado a porta. Vasculhando os armários, encontrou um cálice grande. Pediu-nos que abandonássemos o miserável por uns instantes.
- Você está vendo – disse a Simone – estas hóstias no cibório e agora este cálice onde se coloca o vinho.
- Cheira a porra – disse ela, farejando os pães ázimos.
- Justamente – continuou o inglês - , estas hóstias que você está vendo são o esperma de Cristo transformado em bolinhos. E o vinho, os eclesiásticos dizem que é o sangue. Enganam-nos. Se fosse realmente o sangue, eles beberiam vinho tinto, mas só bebem vinho branco, porque sabem perfeitamente que se trata de urina.
A demonstração era convincente. Simone agarrou o cálice e eu me apoderei do cibório: Don Aminado na sua poltrona, foi percorrido por um ligeiro tremor.
Simone começou por lhe aplicar uma grande pancada na cabeça, com a base do cálice, que o excitou mas acabou de bestializá-lo. Chupou-o de novo. Ele emitiu gemidos desprezíveis. Ela o levou aos limites da fúria dos sentidos e então:
- Isso não é tudo – disse - , é preciso mijar.
Deu-lhe outra bofetada.
Despiu-se na frente dele e eu a masturbei.
O olhar do inglês estava tão duro, cravado nos olhos do jovem bestializado, que a coisa aconteceu sem dificuldade. Don Aminado encheu ruidosamente de urina o cálice que Simone mantinha sob seu cacete.
- E agora, beba – disse Sir Edmond.
O miserável bebeu num êxtase imundo.
Simone chupou-o de novo; ele urrou tragicamente de prazer. Com um gesto demente, atirou o penico sagrado, que rachou contra a parede. Quatro braços robustos o agarraram e, de pernas abertas, corpo quebrado, berrando como um porco, cuspiu sua porra nas hóstias do cibório que Simone segurava sob ele enquanto o masturbava.
(Georges Bataille, Histoire de l´oeil)
domingo, 3 de janeiro de 2010
o que eles querem
Vallejo escrevendo sobre
solidão enquanto morria de
fome;
a orelha de Van Gogh rejeitada por uma
puta;
Rimbaud correndo para a África
em busca de ouro e encontrando
um caso incurável de sífilis;
Beethoven ficou surdo;
Pound foi arrastado pelas ruas
numa gaiola;
Chatterton tomou veneno para rato;
o cérebro de Hemingway pingando dentro
do suco de laranja;
Pascal cortando os pulsos na banheira;
Artaud trancado com os loucos;
Dostoiévski de pé contra um muro;
Crane pulando na hélice de um barco;
Lorca baleado na estrada pelo exército
espanhol;
Berryman pulando de uma ponte;
Burroughs atirando na mulher;
Mailer esfaqueando a sua;
- é isso o que eles querem:
o danado dum show
uma placa luminosa
no meio do inferno.
é isso o que eles querem,
aquele bando de
estúpidos
inarticulados
tranqüilos
seguros
admiradores de
carnavais.
(Bukowski, tradução de Pedro Gonzaga)
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