terça-feira, 22 de setembro de 2009
sexta-feira, 18 de setembro de 2009
aqueles dias
aqueles dias
Ao irmão.
aqueles dias
de luta
de luto
(de vinho e chá escuro)
eu poderia te dizer um único verso:
fumo de tabaco rói o ar.
antes eu,
e dentro batia
no peito a rugir; filhote
de leão manso
dizem a cabeça pende
e hoje, irmão,
na caçada leão de juba
(juba grisalha e rala)
um poema, uma navalha
em lugar de uma carta
um sonho mesmo às escuras
e o som das metralhas
onde somente a rugir
ventania sul implacável
intermináveis chuvas a molhar os caminhos
tigre cerúleo
e quando a me lembrar
de ti, irmão, vinha-me
ira, Rússia, camponeses, vermelho.
meu irmão,
nossos irmãos, irmão de sangue
irmãos russos se esvaindo
como sementes leves
Maiakóvski, Marina, Iessiênin
suicidados poetas na margem dos melífluos enxurros
tu me dissestes: - esta noite eu corri
com os animais pela madrugada
me salvastes a vida, irmão.
...............................................................................
aqueles dias de luta
de luto
de pó e sangue escuro
diziam leão e tigre
rugidos esquecidos, extintos.
Anos
de servidão e de miséria
comandavam
nossa bandeira vermelha.
aqueles dias, irmão
Neve dos tempos.
(Ilha, 18/09/09, 14h10 e chove muito)
terça-feira, 15 de setembro de 2009
Aleksiéi Krutchônikh (caderno russo IV)
FOME
Lavouras trigosas viraram lenda antiga ...
Tulhas de cereal estalam ressecadas
Campoentos madeireses transformados em tílias
Em lascas as maçãs das faces – magras ...
..........................................................
Na isbá, teto de furos e fumaça,
Cinco filhotes louro-palha
Esgazeiam olhos de pássaro,
Hoje sobre a mesa fumegam tigelas fartas! ...
- Comam deste guisado macio,
Mas comam tudo, sem deixar vestígio,
Senão aquele Silvano ruivo
(Cochila como um carneiro junto à porta do vizinho)
Vai carregar mamãe de mansinho ...
A mãe falou e saiu pé ante pé ...
As crianças rilhavam famintas.
De repente no caldeirão de viés
Viram braços boiando com tripas.
- Uh! Oh! – berram todas para a porta,
E agora em coro fazem: Ah!
A mãe lá estava – morta,
Pescoço azul enroscado em estopa!...
As crianças correram até a escarpa
- Carcaça semi-rota atrás chuchava sopa –
Sinal-da-cruz, e como lebres na água
Se atiram para braços que abraçam ...
O fato se passou perto da Páscoa ...
O sangue do assassinado voltado para cima
Pedia aos homens penitência e prece.
Junto ao muro do reino celeste
A alma da enforcada se reclina ...
(Aleksiéi Krutchônikh, 1920 – tradução de Haroldo de Campos e
Boris Schnaiderman)
segunda-feira, 14 de setembro de 2009
PERSE e a Parede
A PAREDE
O laço da parede está em frente, para conjurar o círculo de
teu sonho.
Mas a imagem solta um grito.
A cabeça contra o descanso da poltrona gorda, examinas os
dentes com a língua: o gosto de gorduras e molhos infecciona-te as
gengivas.
E sonhas com as nuvens puras sobre tua ilha, quando a
aurora verde se elucida no seio das águas misteriosas.
... É o suor das seivas em exílio, o unto amargo das plantas
de síliquas, a acre insinuação das mangueiras carnudas e o ácido
deleite de certa substância negra nas vagens.
É o mel silvestre das formigas nas galerias da árvore morta.
É um sabor de fruto verde, que acidula a aurora que bebes; o
ar leitoso enriquecido com o sal dos alísios ...
Alegria! ó alegria desatada nas alturas do céu! Os panos
puros resplandecem, os adros invisíveis estão semeados de ervas e
as verdes delícias da terra penteiam-se ao século de um longo dia.
(Saint-John Perse, Imagens a Crusoé)
domingo, 13 de setembro de 2009
sábado, 5 de setembro de 2009
Shadow on the sun - Audioslave
SHADOW ON THE SUN
Uma vez eu pensei em descarregar o teu peso
E te deixar naquele lugar.
Você acreditava que eu era capaz
Você já viu acontecer antes.
Eu poderia ler os teus pensamentos
E dizer o que você via
E nunca dizer uma só palavra.
Agora tudo isso está "morto e enterrado"
Para nunca mais voltar...
Eu posso te dizer porquê as pessoas morrem sozinhas
Eu posso te dizer que eu sou uma sombra no sol
Olhando para a perda,
Procurando as causas
Mas nunca tem a certeza.
Não há nada além de um buraco
Para se viver sem alma
E não há nada para aprender...
Eu posso te dizer porquê as pessoas enlouquecem,
Eu posso te mostrar como você também pode enlouquecer,
Eu posso te dizer porquê o fim nunca chegará,
Eu posso te dizer que eu sou uma sombra no sol.
Vultos de todos os tamanhos se movem pelos meus olhos
As portas em minha cabeça estão trancadas por dentro
Cada faísca acende uma vela
Em memória daquele que vive sob a minha pele
Eu posso te dizer porquê as pessoas enlouquecem,
Eu posso te mostrar como você também pode enlouquecer,
Eu posso te dizer porquê o fim nunca chegará,
Eu posso te dizer que eu sou uma sombra no sol.
O FALCÃO, por HOPKINS
THE WINDHOVER
Eis que avistei esta manhã o amado da manhã, delfim do
reino
da luz-do-dia , Falcão arrebatado pela aurora
mosqueada, em seu cavalgar
No ar encapelado que, sob ele, firme se alisa, e ao galgar
Tanta altura, como se eleva espirilando, preso às rédeas de
uma asa ondulante,
Em seu êxtase! E então lá vai, lá vai balouçante
Qual pé de patim macio desliza em arco retesado; o
arremesso, o planar
Afrontam a ventania. Meu coração escondido, em sigilo,
Batia pelo pássaro – o alcance, a mestria daquilo!
Beleza bruta, bravura, ação, oh! altanaria, plumas,
amplidão –
Aqui concentrai-vos! E a fagulha que então de ti irromper,
um bilhão
De vezes mais amorável, mais temível, Ó meu paladino!
Nem surpreende: ao arar paciente, o arado lá sob o sulco
contínuo
Faísca; e o borralho azul-pálido, ah! meu tesouro,
Ao tombar atrita-se, e abre-se em talhos vermelho-e-ouro.
(Gerard Manley Hopkins, 1844-1889)
sexta-feira, 4 de setembro de 2009
anfiteatro
(ao pai.
e tu, sendo pai
é o pai de todas as coisas)
EU SONHEI
em ti,
meu pai.
na penumbra
senti o hálito
espirilado
do fumo
não colhi a lenha
para acender
o fogo
de nosso gelo hirto
e para a casa velha
não apanhei
nenhum junco
carcomido por ratos
não catei
nenhum fruto
não icei balde
para o poço
e água morta
EU ME PERDI
meu pai
em cega furna
e expiação.
(Ilha de SC, 11h30)
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