terça-feira, 15 de setembro de 2009
Aleksiéi Krutchônikh (caderno russo IV)
FOME
Lavouras trigosas viraram lenda antiga ...
Tulhas de cereal estalam ressecadas
Campoentos madeireses transformados em tílias
Em lascas as maçãs das faces – magras ...
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Na isbá, teto de furos e fumaça,
Cinco filhotes louro-palha
Esgazeiam olhos de pássaro,
Hoje sobre a mesa fumegam tigelas fartas! ...
- Comam deste guisado macio,
Mas comam tudo, sem deixar vestígio,
Senão aquele Silvano ruivo
(Cochila como um carneiro junto à porta do vizinho)
Vai carregar mamãe de mansinho ...
A mãe falou e saiu pé ante pé ...
As crianças rilhavam famintas.
De repente no caldeirão de viés
Viram braços boiando com tripas.
- Uh! Oh! – berram todas para a porta,
E agora em coro fazem: Ah!
A mãe lá estava – morta,
Pescoço azul enroscado em estopa!...
As crianças correram até a escarpa
- Carcaça semi-rota atrás chuchava sopa –
Sinal-da-cruz, e como lebres na água
Se atiram para braços que abraçam ...
O fato se passou perto da Páscoa ...
O sangue do assassinado voltado para cima
Pedia aos homens penitência e prece.
Junto ao muro do reino celeste
A alma da enforcada se reclina ...
(Aleksiéi Krutchônikh, 1920 – tradução de Haroldo de Campos e
Boris Schnaiderman)
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