sábado, 17 de julho de 2010

A HORA DOS ASSASSINOS




















Que retrato perfeito de nossos prezados governos! Sempre à procura de um ponto de apoio para conquistar em lugar atroz, sempre apegados a seus ganhos ilícitos, defendendo seus bens, suas colônias, com o exército e a marinha. Para os mais graúdos, o mundo não é suficientemente amplo. Para os pequenos que precisam de espaço, palavras piedosas e ameaças veladas. A terra pertence aos fortes, aos que dispõem dos maiores exércitos e marinhas, aos que brandem o grande porrete econômico. Como é irônico que o poeta solitário que fugiu para o fim do mundo com o propósito de juntar umas parcas economias tivesse que assistir de braços cruzados as grandes potências transformando na maior mixórdia todos os seus sonhos.

“Sim o fim do mundo ... avançar, avançar sempre! Agora começa a grande aventura ... “ Mas, por mais depressa que se avance, o governo sempre chega primeiro, com restrições, com grilhões e algemas, com gases venenosos, tanques e bombas sufocantes. Rimbaud, o poeta, se propõe a ensinar o Alcorão aos meninos e meninas hararis na própria língua deles. O governo preferiria vendê-los como escravos. “Tem alguma destruição que é necessária”, escreveu certa vez, e quanta poeira se levantou por causa dessa simples declaração! Referia-se apenas à destruição intrínseca à criação. Os governos, porém destroem sem a menor justificativa e certamente sem jamais pensar em criação. O que o Rimbaud poeta queria era acabar com as formas velhas, tanto na vida como na literatura. O que os governos querem é preservar a ordem estabelecida, por mais chacina e destruição que isso acarrete.

(...) quando se trata de examinar as atividades de seus prezados governos, sobretudo em relação àquelas intrigas escusas contra as quais Rimbaud se insurgia, desmancham-se em elogios e bajulações. Quando querem puni-lo como aventureiro, falam do grande poeta que foi; quando querem limitá-lo à condição de poeta, falam de seu caos e rebeldia. Mostram-se consternados quando o poeta imita os espoliadores e aproveitadores que adulam e ficam horrorizados quando não tem interesse por dinheiro ou pela vida monótona e tediosa do comum dos mortais.



(Henry Miller, A hora dos assassinos – um estudo sobre Rimbaud)

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