domingo, 15 de janeiro de 2012

Meus Melhores Fragmentos - Hilda Hilst (parte um)



















XII



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Dia doze ... e eu não suportarei
o estado normal das cousas.
O ano que vem, não vou desejar
Felicidades a ninguém.

Nem bom natal, nem boas entradas.

Meus amigos sabem de tudo o que eu sei.
E continuam a viver sem interrupção,
apressadamente como no ato de amor.
São doidos e não percebem que amanhã
Cristina não virá.
Que amanhã Cristina vai morrer
porque ama a vida.

Amanhã serei corajosamente Cristina
Eu, amando todos os que sofrem.
Eu ... essência.

Mas os meus amigos, coitados,
não percebem.
Fazem filhos nascer, fazem tragédia.
Não sabem que o amor não é amor
e a natureza é um mito.

Não sabem de nada os meus amigos.
E não vou explicar
porque podem ficar sentidos.
São puros, vão morrer como anjos.
Vão morrer sem nada saber
daqueles dias perdidos.

Vão morrer sem saber que estão morrendo.



(Hilda Hilst, Presságios – 1950)





I


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Eu cantarei os humildes
os de língua travada
e olhos cegos
aqueles a quem o amor feriu
sem derrubar.

Cantarei o gesto
dos que pedem e não alcançam
a resignação dos santos
o sorriso velado e inútil
dos homens conformados.

Eu cantarei os humildes
o homem sem amigos
o amante sem esperança
de retorno.

Cantarei o grito
de escuta universal
e de mistério nunca desvendado.
Serei o caminho
a boca aberta
os braços em cruz
a forma.

Para mim
virão os homens desconhecidos.



(Hilda Hilst, Balada de Alzira – 1951)





XI


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Tenho pena
das mulheres que riem com os braços
e choram de mentira para os homens.
E descobrem o seio antes do convite
e morrem no prazer ... olhos fechados.

Tenho pena
do poeta feito para só ser pai ... e ser poeta.
E daqueles que dormem sobre o papel
à espera do vocábulo
e dos que fazem filhos por acaso
e dos doidos e do cão que passa

E de mim ... que espero a morte
na confusão e no medo.



(Hilda Hilst, Balada do Festival – 1955)

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