sexta-feira, 28 de setembro de 2012

HISPANISMOS: Vicente Huidobro


























Canto II

(trechos)
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Eis-me aqui perdido entre mares desertos
Só como a pluma que cai de um pássaro na
            noite
Eis-me aqui numa torre de frio
Ao abrigo da lembrança dos teus lábios marítimos
Da lembrança de tuas complacências e de tua
            cabeleira
Luminosa e desatada como os rios de montanha
Irias ser cega para que Deus te desse as mãos?
Pergunto-te outra vez

O arco de teus supercílios estendido para as armas
            dos olhos
Na ofensiva alada vencedora segura com
            orgulhos de flor
Falam-te por mim as pedras espancadas
Falam-te por mim as ondas de pássaros sem céu
Fala-te por mim a cor das paisagens sem vento
Fala-te por mim o rebanho de ovelhas taciturnas
Adormecido em tua memória
Fala-te por mim o arroio descoberto
A erva sobrevivente atada à aventura
A aventura de luz e sangue de horizonte
Sem mais abrigo que uma flor que se apaga
Se há um pouco de vento

Eis-me aqui tua estrela que passa
Com tua respiração de fadigas distantes
Com teus gestos e teu modo de andar
Com o espaço magnetizado que te saúda
Que nos separa com léguas de noite

No entanto te advirto que estamos costurados
À mesma estrela
Estamos costurados pela mesma música estendida
De um a outro
Pela mesma sombra gigante agitada como árvore
Sejamos este pedaço de céu
Este trecho em que se passa a aventura misteriosa
A aventura do planeta que estala em pétalas de
            sonho



(Altazor, tradução de Antonio Risério e Paulo César Souza, 1991)

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